

Até o nosso desventurado conde Stradelli e o sábio Nunes Pereira falam desse moquém que eu desconheço.
Não quero, com isso, dizer que eles estejam errados e eu certo. Não. Escrevo, apenas, escorado no que aprendi, na prática.
Moquear, secar carne no moquém. Sapecar a carne para não se danificar.
Ora, sapecar é processo indesejado, e bem o conheço, porque é o mesmo que chamuscar; crestar... Bem diferente da técnica do moquém, onde a labareda não existe, porque a brasa é enterrada, exatamente para não chamuscar.
Como está nos dicionários, o moquém não passaria de nosso delicioso churrasco (de carne, de peixes, de aves, lingüiça, queijo, calabresa...), pouco importando ser a grelha de varas verdes ou secas, vergalhões de ferro, chapa incandescente...
Pode ser que meus antepassados, por mutação de tradição (isto existe?) até chegar à minha geração, e os nativos com os quais convivi tenham transformado o moquém em churrasco. Tudo é possível.
Contudo, contra tantos abalizados mestres, eu, que não tenho qualquer cacoete de filólogo, continuo a fazer o meu moquém, quando a oportunidade se me oferece, do jeito como o aprendi. E ele, nada tem a ver com churrasco, nem com carne sapecada ou sabrecada (como dizem no interior).
O moquém que aprendi a preparar nos beiradões – e o preparei muitas vezes – tem sabor requintado, e ninguém jamais dele reclamou ou disse tratar-se de qualquer outra iguaria. É preparado assim:
1. cava-se na terra uma vala a gosto, ou conforme o tamanho da peça que se vai assar (por exemplo: 70x40x30). No fundo arrumam-se galhos secos, cavacos, ou cocos de Ouricuri (urucuri) ou de outras palmeiras, feito o que se lhe ateia fogo;O tempo da assadura di-lo o que está moqueando.
2. quando as labaredas transformam o material combustível em brasas, é hora de desencadear o processo e então;
3. pega-se o peixe previamente “tratado”, ou o bloco de carne pronto para o moquém, envolve-se em palha verde de bananeira, cauaçu ou pacavira, atira-se um pouco de terra fina sobre o braseiro para, de pronto, não queimar o invólucro e, sobre a camada de terra ou areia, deita-se peça para assar;
4. ato contínuo, lança-se terra ou areia em cima da carne ou do peixe, envolto em palha verde, até às bordas da vala.
Não tirem, por favor, precipitadas conclusões. O invólucro (palha de bananeira, cauaçu ou pacavira) protege perfeitamente a peça contra qualquer corpo estranho.
Concluindo: moquém, é carne assada unicamente pelo calor, em vala (onde se fez o braseiro), recoberta de terra; churrasco, é carne assada ao calor do braseiro vivo, em grelha suspensa, feita de varas verdes, vergalhões ou chapa, sem ocorrência de chamas; carne sapecada ou sabrecada, é a que posta a assar foi tomada por labaredas e fumaça e chamuscada – uma porcaria.
Ah! O processo de moquém é idêntico ao das caieiras onde se produz carvão de cozinha, guardadas as devidas proporções.
O consumo de peça moqueada é igual ao do churrasco de peixe nos beiradões: ao lado da vala onde se fez o moquém, estende-se uma folha verde de bananeira e, sobre esta a farinha-d’água do Uarini, o sal, o limão e a pimenta-murupi.
Sirvam-se!
Depois, digam se há iguaria que se compare ao verdadeiro moquém.
Disponível em:
http://www.bv.am.gov.br/portal/conteudo/serie_memoria/00122_moquem.php
Pesquisa em: 13/08/2010
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